ESTUDO BÍBLICO E FUNDAMENTOS TEOLÓGICOS DA ORAÇÃO PELOS MORTOS. bibli, biblia,evangelho, jesus

 ESTUDO BÍBLICO E FUNDAMENTOS TEOLÓGICOS DA ORAÇÃO PELOS MORTOS.

Prof. Raymundo Cortizo Perez, (Th.D.)
“Eu acredito que a oração pelos Fiéis Falecidos
é um dever a se observar.” John Wesley
um grande mistério da morte. Ela se levanta contra nós com um poder terrível e incontrolável. Pessoas que amamos nos deixam, colocando-se além de nossas forças. A mortalha se coloca entre nós e os que partiram, levando algo de nós mesmos, de nossos pensamentos, lembranças, sentimentos.
Parte desses sentimentos inclui o de que os falecidos estejam bem, estejam em paz, desfrutem da luz divina. Não sabemos como eles estão, mas só desejamos que estejam melhor do que nós. É nesse amor pelos falecidos (amor que nunca falha), que o bispo Aulén encontra o fundamento para a oração pelos mortos. O amor espera além de toda esperança.
Com toda a evidência, desde muito cedo os cristãos oraram pelos mortos, como exemplificam a Inscrição de Abércio (séc. II) e as referências de Tertuliano (séc. III). As indicações que temos são também de que os judeus do período do Segundo Templo oravam pelos mortos e de que ele necessitavam de expiação (2Mc 12:44-45; Testamento de Abraão 15; Sifre Deverarim 210 etc.). Então a fé cristã se desenvolveu num ambiente em que a oração pelos mortos era uma prática aceitável, não rejeitada.
A prática de interceder pelos cristãos falecidos, durante a liturgia eucarística, é unânime nas liturgias antigas, dos mais diversos lugares, e abundam as referências patrísticas em seu favor. Mas os desenvolvimentos da Reforma Protestante, especialmente na tendência calvinista, levaram a uma rejeição da oração pelos mortos. Ainda assim, vemos a oração pelos mortos ser aprovada e, às vezes, ensinada e praticada por figuras como Lutero, Zuínglio, além de anglicanos como Lancelot Andrewes, John Cosin e John Wesley.
Como uma prática assim pode ter se tornado tão universal até o período da Reforma? Há um fundamento bíblico para ela? Há uma utilidade?
A intercessão pelos mortos é bíblica?
É importante dizer primeiramente que, para que uma prática seja aceita na fé cristã, não é necessário ela seja exigida, exemplificada, ensinada ou autorizada nas Escrituras Sagradas. Nada do que fazemos pode contradizer as Santas Palavras, mas nenhum texto da Escritura jamais foi escrito com o propósito de elencar tudo o que podemos fazer na religião cristã.
A suficiência da Escritura não diz respeito à liturgia, por exemplo. Ninguém pergunta se pode orar por emprego, por exemplo, mesmo que não haja nenhuma oração por emprego na Bíblia. O que perguntamos não é se a Bíblia autoriza a orar por emprego, mas se esse tipo de oração é compatível com os princípios que vemos nas Escrituras. Felizmente, a Escritura nos dá mais do que apenas princípios, como veremos.
Vemos ao longo das Escrituras um costume universal: o luto através do pranto e jejum (de vários dias) pelos falecidos, como por Arão, Moisés, Saul e seus filhos, por Estêvão e tantos outros, mas são o ambiente adequado em que essas orações podem começar a surgir, dados os bons desejos dos vivos pelos mortos.
Primeiramente, sabemos que a Escritura nos ensina a orar “por todos os homens” (1Tm 2:1) e “por todos os santos” (Ef 6:18), isto é, por todos os cristãos. Os contextos jamais limitam essas obrigações aos vivos. Em ambos os casos, há referência a pessoas vivas em redor, mas isso não constitui uma limitação. Afinal, se devemos orar por todos, obviamente os vivos são incluídos! O que procuramos não é uma referência aos vivos, mas uma exclusão dos mortos. Não encontramos essa exclusão, e isso, recordemos, num ambiente judaico e pagão em que a oração pelos mortos era conhecida e aceita. A responsabilidade de não apenas alegar, mas provar que esses “todos os homens” não incluem todos, mas apenas os vivos, é de quem é acredita nessa limitação. Do jeito que está, lido da maneira mais natural, o texto inclui mesmo a todos. A única coisa que impede de perceber essa leitura natural é o preconceito do leitor contra a oração pelos mortos.
Segundamente, vemos que a intercessão pelos mortos era bem conhecida de Paulo e dos cristãos de Corinto. O texto de 1Co 15:29 faz referência a um tipo de intercessão pelos mortos:
Doutra maneira, que farão os que se batizam por causa dos mortos? Se, absolutamente, os mortos não ressuscitam, por que se batizam por causa deles?
1 Coríntios 15:29
Nesse trecho de difícil interpretação, Paulo usa o “batizar-se” pelos mortos como um argumento em favor da ressurreição, como indicando que, de algum modo, a premissa por trás dessa prática é a de que os mortos seria, de algum modo, beneficiados por essa intercessão quando ressuscitassem. Não é possível decidir com segurança o que seria esse batismo pelos mortos, mas sem dúvida era uma prática intercessória, que beneficiaria os mortos. O fato de que Paulo usa a prática como argumento, sem condená-la, mostra que ele via a intercessão pelos mortos como, no mínimo, possível. De modo interessante, vemos nesse texto, assim como em 2Mc 12:40-46 (texto desconsiderado pela maioria dos protestantes), a intercessão pelos mortos aparecer na perspectiva da ressurreição.
Terceiramente, Paulo intercedeu por misericórdia sobre Onesíforo no dia do juízo.
Conceda o Senhor misericórdia à casa de Onesíforo, porque, muitas vezes, me deu ânimo e nunca se envergonhou das minhas algemas; antes, tendo ele chegado a Roma, me procurou solicitamente até me encontrar. O Senhor lhe conceda, naquele Dia, achar misericórdia da parte do Senhor. E tu sabes, melhor do que eu, quantos serviços me prestou ele em Éfeso.
2 Timóteo 1:16-18
Esse texto nos ensina algo muito importante, que afeta diretamente o modo como vemos a oração pelos mortos. Paulo ora por misericórdia do Senhor sobre Onesíforo, no dia do juízo (“naquele Dia”). Com isso, aprendemos com muita naturalidade que podemos orar por misericórdia no juízo final, que é possível Deus realizar misericórdia (cf. Tg 2:13). Isso, por si só, já justifica a oração pelos mortos, uma vez que podemos orar por um dia que chegará quando a maioria de nós já estivermos mortos.
Mas o argumento vai além: Onesíforo provavelmente já havia falecido quando Paulo fez essa oração. O texto faz pouco sentido se Onesíforo ainda estivesse vivo. Os motivos são simples: 1. Paulo pede misericórdia pela família de Onesíforo, mas por Onesíforo ele pede misericórdia apenas no dia do juízo; 2. Onesíforo é mencionado no passado, pelo que fez anteriormente; 3. Em 2Tm 4:19, a família de Onesíforo é mencionava novamente, num contexto de saudação a diversos indivíduos, e essa família recebe uma saudação, mas Onesíforo não recebe diretamente. Assim, os indícios apontam na direção de que esse texto de 2Tm 1:18 seja uma oração pelos mortos. Bem no Novo Testamento.
Por fim, há o exemplo já mencionado de 2Mc 12:40-46. Esse texto não é usado como referência pela maioria dos protestantes, embora faça parte da tradição anglicana (e luterana), não sendo usado para estabelecer uma doutrina, mas apenas para instrução, significando que seu ensinamento não é herético.
Do que foi dito, se segue que: 1. é nosso dever orar por todos os homens, sem distinção (portanto também pelos mortos); 2. a intercessão pelos mortos era conhecida dos primeiros cristãos, não sendo condenada; 3. é possível interceder por misericórdia de Deus no juízo final, independentemente de se estar morto ou não. Assim, no fim das contas, há muito mais fundamento nas Escrituras para orar pelos mortos do que pelos desempregados.
A intercessão pelos mortos é útil?
Que utilidade pode haver na oração pelos mortos? Esse é o questionamento natural de quem não estudou a questão, especialmente se criado num ambiente em que essas orações não existem ou são condenadas. Para quem não refletiu sobre nossa condição após a morte, realmente não há como vislumbrar utilidade nessas orações.
No nosso ambiente ocidental, as orações pelos mortos frequentemente são tratadas em termos de Purgatório, como se dependessem dele. Mas é fato que as primeiras orações pelos mortos que conhecemos apareceram antes do surgimento e popularização da teologia so Purgatório. Até hoje, as comunidades orientais que não acreditam em Purgatório (como ortodoxos e miafisitas) oram pelos mortos. Primeiro vieram as orações pelos mortos; só depois, uma concepção de Purgatório. As explicações dadas aqui são independentes dessa noção.

Já vimos uma das utilidades que a oração pelos mortos tem: misericórdia no juízo. Nós somos julgados por Deus por tudo o que fizemos nesta vida (2Co 5:4), e cabe a Deus realizar a misericórdia pela qual Paulo orou. Essa misericórdia no juízo se enquadra perfeitamente bem na intercessão pelos mortos vista em 1Co 15:29, que diz respeito à ressurreição. É particularmente importante lembrar que nós também somos julgados por Deus após a morte (Hb 9:27), sendo essa outra possibilidade de misericórdia no juízo divino.
O que essa misericórdia significa? No caso de Onesíforo, falamos de uma oração feita em favor de um (provável) cristão, de alguém que pode ter morrido em plena comunhão com a Igreja. Nesse sentido, essa oração se pareceria com as que aparecem nas liturgias antigas. Não se trata de uma oração por alguém sem fé, mas, possivelmente, com fé, ainda que seja uma fé que não se sabe se é totalmente viva. A questão da oração por um “incrédulo” (ninguém é incrédulo depois da morte) seria mais complicada, mas, de toda forma, como há diferentes graus de condenação, a misericórdia ainda seria possível, mas parece desrecomendada (1Jo 5:16-17). Como não sabemos o destino de ninguém, podemos orar. Nada está perdido, porque Deus atende nossas orações desde a eternidade, e não limitado ao momento em que oramos.
Mas há algo mais, além disso. Pois, mesmo os salvos que já estão na luz divina, em Cristo, ainda podem crescer infinitamente no conhecimento e no amor (epektasis), portanto também na felicidade, mesmo depois que o pecado for completamente extirpado. Assim como, oramos pelos que estão vivos, para sua santificação e crescimento em Deus, oramos pelos que faleceram, para que cresçam cada vez mais em Deus, porque para Deus nada é impossível. Nossas orações são meios pelos quais Deus cumpre seus propósitos eternos.
No amor de Cristo Jesus, Graça e Paz!

ESTUDO FILIPENSES 2:1-10 - bíblia teologia estudo evangelho

ESTUDO FILIPENSES 2:1-10
Prof. Raymundo Cortizo Perez, (T.h.D).
Filipenses 2 é um dos capítulos mais amados e citados do Novo Testamento. A carta, tradicionalmente atribuída ao apóstolo Paulo e enviada à igreja de Filipos, foi escrita para encorajar os cristãos a permanecerem firmes na fé, unidos no amor e comprometidos com o estilo de vida de Cristo — marcado por humildade, serviço e obediência. Neste artigo informativo e expositivo, vamos responder de forma clara à pergunta: “O que fala em Filipenses 2?”
Contexto essencial
>Autor e destinatários: Paulo escreve a uma comunidade vibrante e parceira no Evangelho, a igreja de Filipos.
>Propósito pastoral: fortalecer a unidade e a alegria no Senhor; combater a vaidade e a rivalidade; promover a humildade cristã.
>Ênfase do capítulo 2: chamar os crentes a terem “o mesmo sentimento que houve também em Cristo Jesus” (Fp 2:5), modelado pela sua kenosis — o “esvaziar-se”.
Por que Filipenses 2 é central para a teologia cristã?
>Humildade e serviço (Fp 2:1–4): o chamado a considerar os outros superiores a si mesmos e cuidar dos interesses alheios.
>O hino cristológico (Fp 2:5–11): Cristo se humilha, “Jesus se esvaziou de si mesmo”, obedece até a morte, e Deus o exalta, concedendo-lhe o “nome sobre todo nome”.
>Vida prática de santidade (Fp 2:12–16): “desenvolvei a vossa salvação…”, vivendo sem murmurações, como luzeiros no mundo.
>Exemplos vivos (Fp 2:17–30): Paulo, Timóteo e Epafrodito encarnam o ethos de Cristo no cotidiano do discipulado.
O que você encontrará neste estudo (mapa do artigo)
>Panorama histórico-literário: por que e para quem Paulo escreveu.
>Exegese por blocos (2:1–4; 2:5–11; 2:12–16; 2:17–30): sentido, teologia e aplicações.
>Aplicações práticas para igreja, família e trabalho, com ênfase em humildade e serviço.
>Principais expressões e dúvidas que o leitor costuma ter ao estudar “Fl 2”.
Termos-chave e buscas relacionadas
>“tende em vós o mesmo sentimento” (Fp 2:5) — discipulado e mente de Cristo.
>“Jesus se esvaziou de si mesmo” — significado da kenosis (Fp 2:7).
>“nome sobre todo nome versículo” — exaltação de Cristo (Fp 2:9–11).
>“considerem os outros superiores” — ética comunitária (Fp 2:3–4).
>“Fl 2” — abreviação recorrente em estudos e buscas.
Como ler este capítulo com proveito
>Observe o contraste entre ambição egoísta e humildade (2:3–4).
>Medite no movimento descendente (humilhação) e ascendente (exaltação) de Cristo (2:6–11).
>Traga para a prática: o que significa “desenvolver a salvação” no seu contexto? (2:12–13)
>Procure modelos vivos de serviço cristão (Paulo, Timóteo, Epafrodito) e aplique à sua comunidade.
>Em síntese, Filipenses 2 apresenta o coração do Evangelho em ação: Cristo humilde e obediente, exaltado soberanamente, chamando sua igreja a viver a mesma disposição — o sentimento de Cristo. A partir daqui, avançaremos por cada bloco do capítulo para compreender seu significado, relevância e aplicações para a vida cristã hoje.

Contexto histórico e literário de Filipenses 2
Para compreender plenamente o texto de Filipenses 2, é essencial mergulhar em seu contexto histórico e literário. Esse pano de fundo ilumina as razões pelas quais o apóstolo Paulo escreveu e ajuda a perceber como o capítulo se conecta ao restante da carta aos Filipenses.
A cidade de Filipos
Localização: Filipos era uma importante cidade da Macedônia, situada em uma rota estratégica chamada Via Egnatia, que conectava o Oriente e o Ocidente do Império Romano.
História: Recebeu o nome de Filipe II da Macedônia, pai de Alexandre, o Grande. Tornou-se colônia romana após a batalha de Filipos (42 a.C.), onde Marco Antônio e Otávio derrotaram Bruto e Cássio.
Perfil cultural: Por ser colônia romana, os cidadãos de Filipos desfrutavam de status especial, com direitos civis e forte influência da cultura latina.
A igreja em Filipos
Foi a primeira comunidade cristã fundada na Europa, resultado da viagem missionária de Paulo registrada em Atos 16.
Convertidos iniciais incluem Lídia (uma comerciante de púrpura), o carcereiro de Filipos e sua família.
Era uma igreja querida e próxima de Paulo, conhecida por sua generosidade em apoiá-lo financeiramente em outras missões (Fp 4:15–16).
O objetivo da carta
>Paulo escreve da prisão (provavelmente em Roma), demonstrando alegria e gratidão mesmo em circunstâncias adversas.
>O tom é de amizade e encorajamento, mais do que de correção (como em Gálatas ou 1 Coríntios).
>Entre os objetivos principais: fortalecer a unidade da igreja, advertir contra o orgulho e encorajar a perseverança no Evangelho.
Relação de Filipenses 2 com o restante da carta
>Capítulo 1: Paulo fala sobre suas prisões, o avanço do Evangelho e a necessidade de viver de maneira digna de Cristo. Isso prepara o leitor para o chamado à unidade e humildade em Filipenses 2.
>Capítulo 2: O coração teológico da carta, com o hino cristológico (2:5–11), apresentando a kenosis de Cristo (“Jesus se esvaziou de si mesmo”) e a exaltação ao “nome sobre todo nome”.
>Capítulo 3: Paulo contrasta sua vida passada com a nova vida em Cristo, apontando para a superioridade do conhecimento de Jesus.
>Capítulo 4: Um chamado final à alegria, gratidão e paz que vem de Deus.
O papel de Filipenses 2
Enquanto todo o livro enfatiza a alegria no Senhor, o capítulo 2 funciona como a espinha dorsal teológica. Ele mostra, de forma prática e doutrinária, como a humildade de Cristo deve moldar a vida da igreja. Por isso, estudiosos consideram Filipenses 2 um dos textos mais profundos e poéticos de todo o Novo Testamento.
Assim, entender esse contexto histórico e literário não apenas enriquece a leitura, mas também ajuda a captar a mensagem original de Paulo, evitando interpretações superficiais e fortalecendo a aplicação prática da Palavra de Deus.
Filipenses 2:1-4 – Unidade e humildade no corpo de Cristo
Nos primeiros quatro versículos de Filipenses 2, Paulo apresenta um dos ensinos mais belos sobre unidade e humildade na vida cristã. Ele inicia com uma série de exortações que revelam o coração pastoral de quem deseja ver a igreja vivendo em harmonia, sustentada pelo amor de Cristo e pelo poder do Espírito Santo.
O texto (Filipenses 2:1-4):
"Portanto, se existe alguma exortação em Cristo, alguma consolação de amor, alguma comunhão do Espírito, se há profundo afeto e sentimento de compaixão, completai a minha alegria, para que penseis a mesma coisa, tenhais o mesmo amor, sejais unidos de alma, tendo o mesmo sentimento. Nada façais por partidarismo ou vanglória, mas com humildade, considerando cada um os outros superiores a si mesmo. Não atente cada um somente para o que é seu, mas também para o que é dos outros."
Explicação dos versículos
>v.1: Paulo apela à experiência cristã: se existe encorajamento em Cristo e comunhão no Espírito, então isso deve resultar em uma vida de unidade.
>v.2: O apóstolo pede que sua alegria seja completa ao ver os irmãos “pensando a mesma coisa” e “tendo o mesmo amor”. Essa unidade não é uniformidade forçada, mas harmonia gerada pelo Espírito.
>v.3: O coração da exortação: “nada façais por partidarismo ou vanglória”. O orgulho e a busca de status são substituídos pela humildade.
>v.3b: A frase-chave: “considerem os outros superiores a si mesmos”. Isso não significa autodepreciação, mas sim reconhecer o valor do próximo e colocar o bem coletivo acima do interesse próprio.
>v.4: O chamado para olhar não apenas para os próprios interesses, mas também para os dos outros, enfatizando a vida comunitária em contraste com o egoísmo.
Lições centrais de Filipenses 2:1-4
>Unidade verdadeira nasce da comunhão no Espírito, e não de esforços humanos isolados.
>Humildade é a chave para quebrar rivalidades e competições dentro da igreja.
>A ética cristã é marcada pelo altruísmo: o crente é chamado a servir e valorizar os outros.
Aplicações práticas para a vida cristã
>Na igreja: evitar divisões e comparações, trabalhar para o bem comum e para o crescimento do corpo de Cristo.
>Na família: cultivar a empatia, priorizando o diálogo e o respeito em vez da imposição da própria vontade.
>No trabalho e na sociedade: praticar a humildade, reconhecendo os talentos e contribuições alheias, sem buscar apenas status ou reconhecimento.
>Reflexão: A mensagem de Filipenses 2:3-4 é radicalmente contra a lógica do mundo, que valoriza o individualismo e a autopromoção. Paulo ensina que a vida cristã floresce quando cada um está disposto a servir em vez de ser servido, valorizar em vez de competir, e unir em vez de dividir.
Assim, estes versículos lançam a base do que será aprofundado no restante do capítulo: a humildade de Cristo como modelo supremo de vida e fé.
Filipenses 2:5-11 – O hino cristológico
Entre os textos mais belos e profundos do Novo Testamento, Filipenses 2:5-11 ocupa lugar de destaque. Muitos estudiosos o chamam de “hino cristológico”, pois apresenta de forma poética e solene a trajetória de Cristo: da glória eterna à encarnação humilde, da morte na cruz à exaltação suprema por Deus Pai. Esse trecho é considerado um resumo do Evangelho em linguagem de adoração.
O texto (Filipenses 2:5-11):
“Tende em vós o mesmo sentimento que houve também em Cristo Jesus, o qual, subsistindo em forma de Deus, não julgou como usurpação o ser igual a Deus, mas esvaziou-se a si mesmo, tomando a forma de servo, fazendo-se semelhante aos homens; e, achado na forma de homem, humilhou-se a si mesmo, tornando-se obediente até à morte, e morte de cruz. Pelo que também Deus o exaltou sobremaneira e lhe deu o nome que está acima de todo nome, para que ao nome de Jesus se dobre todo joelho, nos céus, na terra e debaixo da terra, e toda língua confesse que Jesus Cristo é Senhor, para glória de Deus Pai.”
“Tende em vós o mesmo sentimento”
>A expressão inicial (Fp 2:5) é um convite para que os cristãos imitem o modo de pensar e agir de Cristo.
>Paulo mostra que a vida cristã não é apenas seguir regras, mas adotar a mentalidade de Cristo, marcada por humildade, renúncia e obediência.
>Isso liga diretamente os versículos anteriores (2:1-4) ao exemplo supremo de Cristo.
“Jesus se esvaziou de si mesmo” (Kenosis)
O termo “kenosis” vem do grego ekenōsen, que significa “esvaziar”.
Não significa que Jesus deixou de ser Deus, mas que abriu mão de seus privilégios divinos, assumindo a condição de servo.
Esse “esvaziamento” inclui:
Escolher a encarnação — tornar-se verdadeiramente humano.
Viver em humildade e sujeição às limitações humanas.
Obedecer até a morte de cruz, a forma mais humilhante de execução romana.
O foco está no amor sacrificial: Cristo não buscou ser servido, mas servir.
O movimento descendente e ascendente do hino
Humilhação (descida) Exaltação (subida)
Forma de Deus → forma de servo Deus o exaltou sobremaneira
Semelhante aos homens Nome acima de todo nome
Obediência até a morte Todo joelho dobrará
Morte de cruz Toda língua confessará que Ele é Senhor
“Nome sobre todo nome”
Após a humilhação, vem a exaltação divina: Deus concede a Jesus o título supremo.
O “nome” aqui não é apenas “Jesus”, mas a plena revelação de sua autoridade como Senhor (Kyrios).
Esse título confirma a divindade de Cristo e sua posição de governo sobre céus, terra e debaixo da terra.
É a vitória definitiva: todos reconhecerão, de forma voluntária ou forçada, que Jesus Cristo é Senhor.
Lições para os cristãos
Humildade precede exaltação: a glória vem após a renúncia.
Servir aos outros é espelhar a mente de Cristo.
O verdadeiro poder se manifesta na obediência e no amor, não na imposição.
Todo cristão é chamado a viver a mesma dinâmica: esvaziar-se do ego e confiar que Deus exalta no tempo certo.
Reflexão final: O hino cristológico de Filipenses 2:5-11 mostra o coração do Evangelho: Cristo desceu ao ponto mais baixo para nos salvar e foi elevado ao ponto mais alto para ser reconhecido como Senhor. Esse movimento de descida e subida é o modelo da vida cristã: serviço, humildade e obediência levam a glória de Deus.
No amor de Cristo Jesus, Graça e Paz.

A BATALHA ESPIRITUAL: ANÁLISE DE EFÉSIOS 6.10-20

 A BATALHA ESPIRITUAL: ANÁLISE DE EFÉSIOS 6.10-20

Doutor Raymundo Cortizo Perez, (Th.D.)
55 17 981 065410 WhatsApp
I. VISÃO GERAL DA CARTA.
Nos três primeiros capítulos o apóstolo Paulo fala sobre os privilégios dos cristãos e o que significa ser igreja. A partir disso ele começa a falar de como Deus, desde a eternidade, elegeu e predestinou dentre a humanidade aqueles que ele quis salvar. Paulo fala do fato de que Jesus veio ao mundo para morrer por estas pessoas e oferecer na cruz um sacrifício eficaz por elas, e termina dizendo como o Espírito Santo chama os eleitos de Deus através da história pela pregação do evangelho e forma um corpo que é a Igreja. Este corpo é formado por homens e mulheres, pobres e ricos – todos aqueles que professam o nome Cristo como seu Senhor e Salvador. Tudo isso Paulo aborda nos capítulos 1 ao 3.
Depois disso, Paulo passa a falar dos deveres dos cristãos, ou seja, da maneira como nós, que fomos alcançados pela graça de Deus no Evangelho, devemos viver nesse mundo. Ele fala da necessidade da unidade da Igreja e sobre os dons espirituais que Deus deu para a Igreja. Ele aborda também a questão da santidade e fala como devemos nos separar do pecado, nos despindo do velho homem e nos revestindo do novo homem em Cristo. Tudo isso no capítulo 4.
No capítulo 5 e metade do capítulo 6, Paulo nos orienta a buscar uma vida cheia do Espírito Santo. Esta vida cheia do Espírito Santo está ligada ao casamento, à criação dos filhos e à sociedade (empregados e patrões).
Paulo termina a carta advertindo seus leitores (e a nós!) de que não será fácil vive nesse mundo com os privilégios de sermos filhos de Deus e obedecê-lo. Teremos dificuldades de fazer o que Deus nos pede em relação a nossa família, ao casamento, à sociedade, nos relacionamentos fraternais e na nossa própria vida. Essa dificuldade se dará porque há inimigos poderosos, mais fortes do que nós, que lutarão para nos impedir de obedecermos a vontade de Deus. Tudo isso no final do capítulo 6.
1. Autoria.
Podemos afirmar com toda certeza que a Carta aos Efésios é produto da pena de Paulo. Logo no início da carta ele se apresenta como o autor: “Paulo, apóstolo de Cristo Jesus por vontade de Deus aos santos que vivem em Éfeso e fiéis em Cristo Jesus” (Ef 1.1). Paulo repete seu nome em Ef 3.1. Esta saudação é parecida com a saudação de 2Co 1.1 e Cl 1.1. A referência mais antiga que diz que Paulo é o autor da carta vem do ano 95 a.C. Desde a metade do segundo século, a carta é conhecida entre os cristãos.[1]
Uma tradição antiga descreve Paulo como alguém de pequena estatura, pouco cabelo, pernas curvas, corpo em boas condições, sobrancelhas juntas e nariz um pouco adunco.[2]
2. Data e Ocasião.
Quatro cartas do apóstolo Paulo são chamadas de “Cartas da prisão” ou “cartas do Cativeiro”. São elas: Efésios, Filipenses, Colossenses e Filemom. Sabemos disso porque Paulo nos informa isso: Ef 3.1, 4.1, 6.20; Fp 1.7, 13,14; Cl 4.18; Fm 1,9. A Carta aos Efésios foi escrita durante os dois anos em que Paulo ficou preso em Roma (At 28.16-31). Esta foi a primeira vez que Paulo ficou preso em Roma, provavelmente nos anos 58-60 d.C. Foi escrita logo depois da Carta aos Colossenses e ambas foram levadas por Tíquico (Ef 6.21; Cl 4.7). Efésios foi escrita provavelmente entre 60 ou 62 d.C.[3]
II. ANÁLISE DE EFÉSIOS 6.10-20.
À partir de agora analisaremos o texto de Ef 6.10-20. Faremos uma análise de cada um dos versículos, dividindo-os em três seções. As palavras em negrito pertencem ao texto bíblico em análise.
Devemos ter sempre em mente o contexto em que Paulo nos introduz o assunto de batalha espiritual. Desde Ef 4.17, o assunto predominante que Paulo está tratando é santidade, e ele continua com esse mesmo assunto em Ef 6.10-20. Em Ef 6.10-20, o que o apóstolo está nos dizendo é que não será fácil levarmos uma vida de santidade neste mundo porque temos inimigos poderosos que nos impedirão de fazê-lo.
1. O inimigo: Ef 6.10-12.
A primeira tarefa do apóstolo Paulo ao abordar o assunto da batalha espiritual é nos informar sobre os inimigos que enfrentamos. Paulo deixa bem claro que Deus está no controle de tudo e que é ele que provê a armadura. Deus é a pessoa chave nessa “batalha”. Aqui o apóstolo nos mostra a funcionalidade da armadura de Deus, que é para que resistamos às ciladas do diabo, nosso inimigo espiritual e invisível e que é mais forte do que nós.
Ef 6.10: Quanto ao mais, sede fortalecidos no Senhor e na força do seu poder.
A expressão quanto ao mais[4] significa finalmente ou quanto ao restante. É como se ele estivesse falando assim: “eu já falei isso e isso, agora só falta falar mais uma coisa”. Paulo nos dá uma ordem: sede fortalecidos no Senhor e na força do seu poder. A expressão sede fortalecidos[5] está no presente passivo no texto original. O tempo presente indica que algo está sendo feito agora. A voz passiva indica que algo está sendo feito em alguém. Isso significa que o ato de ser fortalecido é algo que está acontecendo agora e que alguém está fazendo isso em nós. Com base no texto podemos descobrir que é Deus quem nos fortalece e a origem desse poder está nele. É Deus quem nos fortalece nele e em seu poder. A voz passiva sugere que nós mesmos não podemos fazer isso.
Este poder que vem de Deus é o mesmo que foi mencionado em Ef 1.19 e Ef 3.16. Em Ef 1.19, Paulo diz que Deus ressuscitou Cristo por meio do seu poder, e em Ef 3.16 lemos que este poder nos é dado por meio do Espírito Santo para que Cristo habite em nós.[6]
Ef 6.11: Revesti-vos de toda armadura de Deus, para poderdes ficar firmes contra as ciladas do diabo.
Paulo fala sobre nos revestirmos em Rm 13.12-14; 2Co 6.7; 1Ts 5.8. Em Is 59.17, Deus é descrito vestindo uma armadura. O texto de Ef 6.11 deixa bem claro que esta armadura pertence a Deus e não a nós – armadura de Deus. A palavra armadura no texto grego é panoplía e se refere à armadura de um soldado fortemente armado da cabeça aos pés.[7] Esta armadura serve para que haja defesa contra as ciladas do diabo. Paulo introduz o nosso inimigo, e nos diz que seu nome é Diabo.[8] A palavra diabo significa “acusador”.
Como já foi dito, essa armadura serve par nos defender das ciladas do nosso acusador. A palavra “ciladas” no texto grego significa tramas, truques.[9] Estas ciladas são os truques de Satanás para enganar os cristãos (2Co 11.14). As ciladas são também as tentações à incredulidade, ao pecado e à conformidade com o mundo. Paulo teve experiências com essas ciladas e nos adverte: “não ignoreis os seus ardis” (confira: 1Co 7.5; 2Co 11.3,14; 1Ts 2.18).[10]
Ef 6.12: Porque a nossa luta não é contra o sangue e a carne, e sim contra os principados e potestades, contra os dominadores deste mundo tenebroso, contra as forças espirituais do mal, nas regiões celestes.
Paulo deixa claro que não lutamos contra forças humanas, porque ele diz que a nossa luta não é contra o sangue e a carne. Nossos inimigos são invisíveis aos nossos olhos. São eles: principados, potestades, dominadores do mundo e forças espirituais. Alguns intendem que os principados, potestades e os dominadores são uma e a mesma coisa: as forças espirituais do mal, os seres espirituais que o diabo governa. Outros interpretam como sendo classes hierárquicas do exército de Satanás.
Paulo menciona esses seres espirituais em Ef 1.21; 2.2; 3.10; Rm 8.38,39; Cl 1.13. o texto de Ef 1.21 nos chama a atenção. O texto diz que Cristo está acima de todo “principado, e potestade, e poder, e domínio”. Quando lemos o texto de Ef 6.12 à luz de Ef 1.21 aprendemos que Satanás está debaixo da autoridade de Cristo. Muitas vezes ouvimos tanto que Satanás “tem poder” que parece que ele é um poder independente, poderoso igual a Deus, mas que anda na direção contrária.[11] Isso é um erro muito grave. Satanás não é deus, ele não é igual a Deus e ele só vai até onde Deus lhe permitir. Ele está debaixo do domínio de Cristo. O livro de Jó nos prova isso quando Satanás tocou na vida de Jó e só pôde tocar onde Deus lhe permitiu. Devemos entender que quando a Bíblia diz que Satanás tem poder, isso se refere ao fato de que ele é mais forte do que nós seres humanos, e não que ele é poderoso em si.[12]
2. O equipamento: Ef 6.13-17.
Tendo introduzido o nosso inimigo, agora Paulo introduz a armadura de Deus. Lembre-se que esta armadura não pertence a nós, mas a Deus. Outra coisa que precisamos lembrar é o fato de que o apóstolo Paulo estava preso junto a um soldado romano da guarda pretoriana. A armadura do soldado romano serviu de instrumento para Paulo montar sua metáfora da armadura de Deus.
Políbio (210 a.C. – 120 a.C.) escreveu diversos livros de história e por isso se tornou autoridade em táticas de guerra. Em um de seus livros, ele fez uma descrição completa da vestimenta que a infantaria romana usava. Paulo omite duas peças essenciais: as grevas, parte da armadura que cobria as pernas desde os joelhos aos pés, e as lanças. Entretanto, alguns estudiosos entendem que Paulo não estava se baseando totalmente na figura do soldado romano, mas que ele tinha em mente a figura do Antigo Testamento que descreve Deus como um guerreiro nos textos de Is 11.4,5; Is 59.14-17.[13]
Não há nada de surpreendente na armadura. O que encontramos nela é o velho “feijão com arroz” que aprendemos na Escola Dominical: oração, leitura da Palavra, vida justa e reta diante de Deus etc. O que Paulo nos apresenta aqui é apenas uma ilustração daquilo que caracteriza a vida cristã. Essas características são tudo aquilo que Cristo conquistou na cruz para nós.
Ef 6.13: Portanto, tomai a armadura de Deus, para que possais resistir no dia mal e, depois de terdes vencido tudo, permaneceis inabaláveis.
Este versículo é crucial para entendermos o papel do soldado que Paulo está descrevendo. É muito comum ouvirmos dizer que a igreja tem que ir ao ataque contra os demônios, ir contra os poderes do mal. No entanto, não é essa a figura que Paulo pinta aqui. A figura de Paulo diz respeito a um soldado que está em terreno conquistado, mas que está sofrendo ataque e precisa se defender. Esta ideia torna-se mais clara quando percebemos a expressão ficar firmes do versículo 11 e permanecer inabaláveis do versículo 13. Embora na tradução em português haja duas palavras diferentes, no texto grego é o mesmo verbo. Este verbo é usado num sentido militar, indicando assumir um posto de vigia ou também significa sustentar-se numa posição crítica durante a batalha.[14]
Paulo repete a exortação de Ef 6.11 sobre tomar a armadura de Deus. Perceba que o texto insiste em deixar claro que a armadura pertence a Deus. O objetivo de tomar essa armadura é para “resistir o dia mal”. Em Ef 5.16 lemos que os dias são maus. O “dia mal” de Ef 6.13 é o dia do conflito da nossa alma, e pode ser qualquer luta espiritual em nossa vida. Lembremo-nos do que diz o Sl 34.19: “Muitas são as aflições do justo, mas Senhor de todas o livra”.[15]
Ef 6.14: Estai, pois, firmes, cingindo-vos com a verdade e vestindo-vos da couraça da justiça.
A palavra firme aparece novamente no texto e é o mesmo verbo utilizado nos versículos 11 e 13 (vide acima).[16] A NVI traduziu a frase estais, pois, firmes por “assim, mantenham-se firmes”. A NTLH traduziu por “portanto, estejam preparados”. Cingir significa por à cintura, apertar.
Os versículos 14 ao 17 nos apresentam seis peças da armadura: quatro são mencionadas de modo específico, mas o cinturão e as sandálias estão implícitos. Neste versículo o apóstolo Paulo nos apresenta as duas primeiras ferramentas da armadura de Deus: o cinturão e a couraça. Começaremos pelo cinto ou cinturão. A primeira coisa que temos que saber é que cingir significa por à cintura, apertar.[17] O cinto[18] era uma correia ou tira que cercava a cintura com uma só volta a fim de apertá-la, e era também usada como suporte para as bainhas das espadas (2Sm 20.. Alguns cintos eram de couro. O cinto era a peça que mantinha firme todas as peças da armadura; o cinto é o elemento que mantém a estrutura. Esta estrutura é chamada verdade.[19] No versículo 11, o nosso inimigo nos é apresentado com o nome de diabo, nome de significa acusador. Em Jo 8.44, Jesus nos diz que o diabo é o pai da mentira. Sendo assim, só poderemos resistir-lhe se estivermos fundamentados na verdade. Se, pois, estivermos cingidos com a verdade, nosso inimigo, que nos acusa e que é mentiroso, não terá argumentos válidos para lançar contra nós, pois estamos alicerçados na verdade. Para Paulo, a verdade é um atributo essencial. Essa verdade pode ser integridade, autenticidade e honestidade. Devemos seguir a verdade em amor (Ef 4.15). Falar a verdade é uma das características de uma vida santificada (Ef 4.25).[20]
A segunda peça que nos é apresentada neste versículo é a couraça da justiça. A couraça[21] era feita de couro duro ou de metal e envolvia o corpo todo do soldado, para que todo o tórax (onde estão os órgãos vitais) fosse protegido. A justiça da qual o texto se refere é aquilo que Cristo conquistou na cruz para nós: a justificação (2Co 5.12; Ef 4.24).[22]
A Doutrina da Justificação pela Fé é uma doutrina fundamental para o cristão, mas que infelizmente tem caído no esquecimento na maioria das igrejas pentecostais e neopentecostais. Romanos 5.1 diz: “Justificados, pois, mediante a fé, temos paz com Deus por meio de nosso Senhor Jesus Cristo”. A justificação é o ato de Deus redimir os pecados dos culpados e admitir esses culpados como justos gratuitamente pela sua graça mediante a fé em Jesus Cristo, não por méritos dos pecadores, mas porque Jesus Cristo guardou a lei em nome deles e os redimiu (Rm 3.23-26; Rm 4 ao 5). Porque todos pecaram, todos estão condenados à perdição (Rm 3.9,23). Ninguém poderá ser justificado mediante a guarda da lei de Deus, ou seja, por seus próprios esforços. Os crentes são “feitos justiça” diante de Deus porque ele os trata conforme o merecimento de Cristo. Os crentes são justificados em Cristo (Gl 2.17). Os que foram justificados por meio do sacrifício de Cristo são aqueles que foram predestinados desde a fundação do mundo, (Rm 8.29-30; Ef 1.3-7).[23]
Em resumo, a justificação é algo que não depende de nossos esforços; nós a alcançamos por meio do sacrifício de Cristo. Outro ponto que devemos considerar é que somos justificados pela fé (Rm 5.1). A fé é um dom de Deus, ela não pertence ao ser humano (1C 12.9; Ef 2.. É Deus quem nos concede a fé. Em Rm 10.11 lemos que “… a fé vem pela pregação…”, pois será pela pregação do Evangelho que os eleitos e predestinados serão convertidos. Para encerrar este assunto, em 2 Ts 3.2 lemos que a fé não pertence a todos. Deus a dá para aqueles que ele predestinou desde a eternidade.
Ef 6.15: Calçai os pés com a preparação do evangelho da paz.
Paulo nos apresenta agora as sandálias. As sandálias militares de um soldado romano eram calçados duros, de couro, para proteger os pés, que tinham tachas para manter o equilíbrio em terrenos acidentados proporcionando apoio aos pés. Paulo usa a ilustração da sandália para representar a preparação[24] do evangelho.[25] Isso pode significar duas coisas: 1) o Evangelho é o firme fundamento no qual os cristãos devem apoiar-se; 2) o soldado cristão deve estar preparado para seguir o Evangelho e levá-lo por onde andar para propagá-lo. Se calçarmos (calçai)[26] as sandálias de Evangelho teremos os “pés formosos” de Is 52.7 (cf. Rm 10.15).[27]
O evangelho da paz[28] é a paz com Deus pela salvação através da pregação (Ef 2.17). Em toda a Carta aos Efésios, Paulo ressaltou como o Evangelho traz paz, reconciliando-nos com Deus. Em Efésios, a paz é o elo que mantém a unidade entre os cristãos. Esta paz é a mesma referida em Rm 5.1, a paz que temos com Deus por meio do sacrifício de Cristo na cruz do calvário. Outrora nossa condição perante Deus era de inimizade, pois quem ama o mundo odeia a Deus (1Jo 2.15). Mas agora, pelo sacrifício na cruz, temos paz com Deus, pois fomos reconciliados com ele mediante o Senhor Jesus. Deus não mais nos considera como inimigos, mas como filhos por meio da adoção, Ef 1.5 (cf. Rm 8. 15). É de fundamental importância salientar mais uma vez que este ato da soberania de Deus não nos é dado por nossos méritos, mas unicamente pelo sacrifício substitutivo de Cristo na cruz.
Ef 6.16: Embraçando sempre o escudo da fé, com o qual podereis apagar todos os dardos inflamados do maligno.
O escudo[29] aqui emocionado era aquele maior e mais pesado que protegia todo o corpo. Media cerca de 80 cm por 120 cm. Esses escudos eram escavados na madeira e coberto com couro. A referência é ao scutum dos soldados romanos que tinha uma estrutura metálica e, às vezes, uma massa de metal no centro. Frequentemente as várias camadas de couro eram ensopadas e socadas na água antes da batalha, a fim de apagar as setas incendiárias do inimigo.[30]
A fé[31] aqui descrita é a confiança em Deus. A fé que traz libertação é a fé que nos guarda. Ela nos protege dos dardos inflamado do maligno.[32] Satanás lança dardo inflamados em nosso coração e em nossa mente: mentiras, pensamentos blasfemos, pensamentos de ódio contra os outros, dúvidas e desejos ardentes pelo pecado. Se não apagarmos esses dardos pela fé, eles começarão um incêndio.[33]
Ef 6.17: Tomai também o capacete da salvação e a espada do Espírito, que é a palavra de Deus.
O capacete[34] da salvação[35] era um traje militar ajustado e mais leve para proteger a cabeça e fazia com que o soldado parecesse mais alto e imponente. Os capacetes romanos eram feitos de bronze e tinham uma camada de feltro ou esponja. Satanás deseja atacar nossa mente, foi assim que ele derrotou Adão (Gn 3). O capacete da salvação refere-se à mente controlada por Deus.[36]
A espada[37] do Espírito, ao contrário do que se pensa, não é uma arma de ataque. Ela é uma arma de defesa! Na armadura de Deus (Ef 6.11) não há peças de ataque, só de defesa. Lembre-se de que o soldado que Paulo descreve aqui já está em terreno conquistado e ele tem que se defender do inimigo que o ataca. A palavra grega para espada usada aqui é machaira (lê-se márraira). Este tipo de espada era pequena, aquela que o soldado usava no combate corpo a corpo. Não era a espada mais longa usada em combates. A expressão “espada do Espírito” tem conotação possessiva: pertence ao Espírito, a espada é dele. Isso fica claro uma vez que essa espada é a palavra de Deus e que o Espírito Santo é seu autor (2Pe 1.20,21). Em termos práticos, essa espada é a Palavra específica que precisamos desembainhar numa determinada situação. Para ter a Palavra precisa à mão, o cristão deve conhecer intimamente toda a Bíblia (a Palavra de Deus, ou seja, a espada) e saber manejá-la. Quando Jesus foi ao deserto para ser tentado pelo diabo, ele resistiu aos ataques do diabo respondendo com textos bíblicos: Dt 8.3; Dt 6.16; Dt 6.13 (Dt 10.20). Quando Satanás vier te tentar, que texto você usará para rebater os ataques dele?
3. A energia: Ef 6.18-20.
Esta é a última seção que estudaremos sobre o texto que nos relata a batalha em que estamos inseridos. O assunto geral desta seção é a oração, o único meio de diálogo com o nosso Senhor, por isso não abordaremos cada versículo de forma isolada, mas os trataremos todos juntos.
Ef 6.18-20: Com toda oração e súplica, orando em todo tempo no Espírito e para isto vigiando com toda perseverança e súplica por todos os santos e também por mim; para que me seja dada, no abrir da minha boca, a palavra, para, com intrepidez, fazer conhecido o mistério do evangelho, pelo qual sou embaixador em cadeias, para que, em Cristo, eu seja ousado para falar, como me cumpre fazê-lo.
O versículo 18 parece fazer par com o versículo 13. É como se os versículos 14 ao 17 fossem parêntesis. Sendo assim, o meio pelo qual podemos tomar a armadura de Deus é por meio da oração. A frase oração e súplica quer dizer todo tipo de petição diante de Deus. Note que a oração não é uma das partes da armadura. A comunhão com Deus é a atividade mais elevada de que as pessoas são capazes. A doutrina bíblica da oração destaca o caráter de Deus e a necessidade de estar num relacionamento correto de aliança com ele (Jo 4.24). Em 1Ts 5.17 lemos: “orai sem cessar”.
No amor de Cristo, Graça e Paz!


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